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No. 91 (2004: 5)


 

Guanabara Mitológica

 

Impressões, imagens e mitos

a posteriori:
reflexões motivadas pelo

Colóquio Internacional de Estudos Interculturais

2004

Academia Brasil-Europa

 

 

Encontro de Colonia
de participantes do Colóquio de Estudos Interculturais 2004

2 de maio de 2004

 

Encontro de ColoniaRealizou-se, no dia 2 de maio de 2004, no centro de estudos da Academia Brasil-Europa, em Colonia, um encontro dos participantes alemães do Colóquio Internacional de Estudos Interculturais pelos 450 anos de São Paulo. O objetivo do encontro foi o de possibilitar uma troca de impressões e um balanço geral dos resultados do evento. Nessa ocasião, tratou-se do projeto de publicação das conferências proferidas e dos resultados das discussões.

Uma das sugestões acatadas foi a de consideração das questões levantadas e dos temas debatidos em São Paulo e no Rio de Janeiro no âmbito de seminários e aulas em desenvolvimento na Universidade de Bonn. Os temas do Colóquio seriam assim considerados e aprofundados sob a perspectiva dos Cultural Studies, Gender Studies, História da Cultura Musical na América Latina e das relações Urbanística e Música.

Um dos assuntos que mereceu atenção disse respeito à comparação de imagens de país antes e após os contactos com situações reais. Procurou-se, aqui, refletir sobre as causas de discrepâncias de imagens. Quais seriam as razões pelas quais - apesar de todas as informações e imagens divulgadas pela mídia - os retratos mentais de países e culturas continuam a ser tão distintos dos retratos que se obtém após impressões ao vivo?

Levantou-se a questão também se a imagem ou as imagens que os habitantes de São Paulo e do Rio de Janeiro possuem sobre a sua própria cidade coincidem com aquelas que os observadores de fora possuem anteriormente ou após uma estadia no país.

Alguns dos participantes expressaram a sua surprêsa por terem constatado a existência de esferas sociais e culturais no Brasil que de forma alguma esperavam e não coincidiam com os retratos que faziam da sociedade brasileira. Surpreenderam-se com a visão e as concepções de estudiosos da cultura de diferentes orientações. Nesse contexto, levantou-se a questão do perigo de transplantações de imagens por pesquisadores e mesmo por estudantes latinoamericanos que realizam estudos na Europa e que transferem conceitos e métodos de trabalho baseados em determinada imagem exógena da cultura ao país. Criticou-se, aqui, um certa atitude quase que neo-colonialista ou pelo menos de arrogância esclarecedora que se observa em certos círculos de etnomusicólogos formados na Europa.

Por outro lado, salientou-se que muitas vezes a auto-imagem brasileira que os participantes perceberam no convívio não correspondeu às impressões ganhas na realidade. De um lado, constatou-se um alto sentido de crítica e de auto-crítica relativamente à situação da pesquisa, de publicações, da vida cultural em geral, uma auto-crítica exagerada e não correspondente à realidade, considerando-se o alto nível de instituições e empreendimentos visitados no Brasil, em grande parte superior mesmo àquele de grande parte das cidades européias. Sobretudo a formação de muitos estudantes brasileiros é superior àquele de renomadas universidades européias. O mesmo pode ser dito com relação ao grau de profundidade e diferenciação das reflexões. De outro lado, porém, constatou-se também um surpreendente exagêro da auto-imagem no concernente a convicções sobre a beleza natural e a pujança da flora e da fauna. Aqui parece que imagens antigas, já ultrapassadas ou retratos virtuais criados por letras de música e outros meios que atuam no subconsciente coletivo contribuem para uma percepção encomiástica e seletiva da realidade. O Brasil de magnificente vegetação, de vida animal e floral rica que os viajantes sempre descreveram do passado foi constatado apenas de forma residual e fragmentária nas regiões e cidades visitadas. Uma correção realista de auto-imagens, ainda que dolorosa, poderia talvez abrir perspectivas que levassem o país a recuperar o seu patrimônio natural que historicamente marcou a sua imagem.

Considerou-se também que, pelo que tudo indica, a imagem que os paulistas possuem de sua capital baseia-se em outros critérios do que aquela dos habitantes do Rio de Janeiro. Enquanto no Rio de Janeiro a Natureza continua a ser o fundamento da imagem positiva de "cidade maravilhosa", em São Paulo a Natureza não desempenha papel tão significativo na formação de imagens, apontando-se antes a um ethos local de expansão e desenvolvimento com referências a aspectos do passado (bandeirantes), à industrialização e à capacidade aglutinadora da sociedade.

Pergunta-se, naturalmente, porque a natureza que havia sido tão privilegiada, a de uma colina de amplo panorama situada entre rios, a de uma várzea extraordinariamente fértil que teria sido até mesmo uma espécie de paraíso indígena, a de um posicionamento geográfico emoldurado por serras, a de um clima decantado pelas suas qualidades por viajantes, pudesse ter sido tão subjugada a ponto de praticamente não desempenhar papel relevante nas reflexões sobre a cidade, a sua imagem e identidade.

Quanto ao Rio de Janeiro, levantou-se a questão de critérios de apreciação da sua extraordinária situação natural e suas qualidades de implantação urbana. Estes critérios surgem como de conotações sexistas para estudiosos europeus de acuidade aguçada para questões de gênero, em particular daquelas relativas à mulher. Não haveria a possibilidade de se considerar a beleza da Natureza do Rio com palavras menos antropocêntricas, em eterna comparação de suas linhas com formas femininas? Em todo o caso, as conotações de Gênero na imagem do Rio de Janeiro oferecem-se como objeto de estudos para a aplicação de critérios dessa orientação metadisciplinar em estudos urbanológicos comparativos. Nesse sentido, sugeriu-se que o tema fosse tratado no âmbito do seminário Gender Studies, na Universidade de Bonn.

Como ponto de partida para considerações de Gênero, sugeriu-se texto lido e fixado pelos participantes do Colóquio no Pão de Açúcar, referentes a uma plástica ali instalada no contexto de uma visão poética do Rio de Janeiro segundo Cristóvão Leite de Castro. O texto, "Guanabara Mitológica", de Remo Bernucci, compara o panorama que dali se confronta com uma imagem de mulher carioca: as florestas com os cabelos, as montanhas com os seios, as praias com a cintura, a silhueta geral com a sua graça. Correspondendo ao título, Guanabara Mitológica, o texto refere-se à Ibis ao pé da estátua.

Um estudo mais sistemático de discrepâncias de imagens com as impressões ganhas na realidade pode basear-se em relatos de viajantes do passado. Nem todos os textos foram encomiásticos. Assim, entre muitos outros, Carl Seidler, no seu publicado em Quedlinburg/Leipzig, em 1835 ("Zehn Jahre in Brasilien... "port. Dez anos no Brasil, São Paulo: Martins s/d), oferece um dos mais críticos e negativos textos de significado para estudos de imagens (págs. 37 ss.).

(...)

G.R.
Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui notas e citações bibliográficas. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição (acesso acima).

 

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