Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica
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N° 54 (1994: 4)


 

Ex-voto séc. XIX.
Milagre de S. Gonçalo à galera Fama por intercessão de um devoto vindo do Rio de Janeiro, 1821.Porto

Colóquio Internacional

Anthropos ludens

Questões teórico-científicas relacionadas com a

Música e dança no culto de São Gonçalo de Amarante

Joanópolis e Ubatuba

Instituto Brasileiro de Estudos Musicológicos
Sociedade Brasileira de Antropologia da Música
Comissão dos Descobrimentos de Lagos

sob o patrocínio da
Prefeitura e Câmara Municipal de Joanópolis
Prefeitura de Ubatuba - FUNDART

 

CAMINHOS PARA UMA ANTROPOLOGIA RECÍPROCA

Beatriz Basto da Silva, Macau/Coimbra

 

O apelo à prática da antropologia recíproca, capaz de corrigir os efeitos da visão unilateral dos dominadores, foi sempre o meridiano que me serviu de âncora, no emaranhado portulano mental onde viajei, por via académica, com os descobridores portugueses.

A acção civilizadora e missionária, essa, tomou maioridade dentro de mim com a Viagem com que todos nós sonhamos em Vida e que tive a fortuna de encetar, quando casei e fui viver para o Extremo-Oriente.

Durante muitas décadas, o português nasceu, cresceu e morreu sem sair das fronteiras europeias. Quando muito, viajava pelos livros fora e fazia sua a experiência alheia. Duvido que se possam construir ideias claras, coloridas e autónomas sobre "ser português" por essa simples, embora cómoda, via.

Na minha geração, que hoje já frutificou em filhos e netos, a maioria dos mancebos foram lançados na chamada guerra do Ultramar, que os mobilizou para prolongadas estadias nas terras portuguesas de outras latitudes.

Foi um abrir de olhos, do corpo e da alma.

É fora de Portugal, hoje sei-o bem, que se dimensiona o país e os seus construtores, desde o achamento de ignotos lugares aos nossos dias, num diálogo de séculos, fecundo e reciprocamente enriquecedor, entre as comunidades iniciais, curiosas umas das outras, e entre os luso-descendentes por esse mundo fora.

Foi em Macau que compreendi melhor o esforço civilizador e missionário de quem abre caminho numa densa "floresta" de antípodas culturais, onde há que ensinar tudo e aprender tudo, pois tudo é diferente e a vontade do encontro a todos anima.

A Missão, a curiosidade, o desejo de comerciar novas e variadas mercancias, com avidez de parte a parte, e também a aventura subjacente, são sem dúvida forças motoras de grande energia. Mas não são apenas ingredientes favoráveis os que entram na receita de "Como criar um território português na China".

Macau nasceu há uns 450 anos e nestes 4 séculos e meio, houve épocas de fulgor deslumbrante e de profundo declínio, de alianças promissoras e de perseguições demolidoras, de progresso cultural capaz de irradiar para a China Continental, para o Japão, para Timor e Estreitos, dando a mão à navegação do Índico, e igualmente marés de estagnação, povoadas dos pesadelos da guerra, da fome total, do abandono até da própria pátria. Não se duvida que foi mesmo na desgraça que se temperou o macaense, esse tipo exótico de português, de rosto asiático e sangue latino, em quem convegem a milenar cultura da China e o denodado apego à bandeira das quinas, o culto dos antepassados que originou a questão dos ritos e o ânimo para, se preciso for, sofrer o martírio por amor de Cristo.

A propósito de salvaguardar especificidades, de preservar e caracterizar focos culturais singulares, de os fazer conhecer entre si, pode perceber-se Macau como lugar privilegiado de encontro, no passado e nos nossos dias, de comunidades radicalmente diferentes, cruzando destinos por período tão continuado, em espaço.

 

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