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N° 22 (1993: 2)


 

DAS INVESTIGAÇÕES E HIPÓTESES DE JOÃO BAPTISTA SIQUEIRA CONCERNENTES AOS ELEMENTOS INDÍGENAS NO FOLCLORE MUSICAL BRASILEIRO

Profa.Dra. Ermelinda Azevedo Paz de Souza Barros
Livre-Docente pela Uni-Rio

 

João Baptista Siqueira (1906-) é dos autores mais expressivos no que tange aos estudos musicológicos brasileiros. Professor exemplar, compositor sensível e pesquisador incansável, com representativa literatura como: Modinhas do passado, Pentamodelismo brasileiro, Influência ameríndia na música folclórica do Nordeste, Os Cariris do Nordeste, Canto metafísico, Folclore humorístico, Ernesto Nazareth na música brasileira, Estética musical, Três vultos históricos, Lundum e Lundu, Origem do termo Samba, Ficção e Música e Música na Sociedade.

J. B.Siqueira, com base em estudos, sustenta a tese de que o influxo de música ameríndia na música popular da região chamada por Euclides da Cunha de Tapuiretama (Margem esquerda do Rio São Francisco, em especial no Estado de Pernambuco, até as cabeceiras do Rio Parnaíba) foi notória.

O autor procurou encontrar pontos de incidências entre a melodia aborígene e a do sertanejo nordestino. Em seu trabalho Influência ameríndia na música folclórica do Nordeste (1951), enfoca, ainda, algumas das supostas contribuições ao nosso processo de formação musical (árabe e jesuítica, na visão do autor), com base em documentos de conteúdo histórico. Determina e comprova a influência ameríndia, delimitando, todavia, a área geográfica - objeto de sua pesquisa. Recoreeu também a conhecidos exemplos musicais (sem influência da civilização) fornecidos por Jean Lery, J.B.Spix Martius, Guilherme de Melo, Mário de Andrade e Roquette Pinto. A finalidade desses exemplos era traçar as semelhanças existentes entre a música aborígene e a melódica ocorrente nos sertões nordestinos. São objeto desse trabalho diversas canções analisadas quanto à quadratura rítmica, direção da linha melódica e tipo de estrutura escalar.

Todavia, Luciano Gallet (em Estudos de Folclore, 1934) afirma que o índio não contribuiu para a formação da nossa música atual. Segundo ele, "fala-se muito atualmente que o folclore musical brasileiro é de origem indio-luso-africana. Acho que não. Nunca percebi nitidamente a contribuição direta do índio na nossa música. (...) O folclore brasileiro atual, no que se refere à música, é de origem luso-africana". (Luciano Gallet, Estudos de Folclore, 1934, 42)

O autor se apóia na musicalidade do índio, com forte e fácil disposição para se adaptar ao novo, fato este que levou os missionários a aproveitarem para difundir a música religiosa européia, substituindo em pouco tempo a música primitiva pela outra, recém-vinda. Em função da catequese, a música indígena foi transformada e, ao fim de algum tempo de contato com a civilização, o caráter indígena musical desapareceu.

Iza Queiroz Santos, em Origem e evolução da música em Portugal e sua influência no Brasil (s.d.), compartilha da mesma opinião. Para essa autora, "nos elementos constitutivos da música brasileira encontramos patente a influência dos povos ibérico e africano. Se bem que seja convicção geral que o fator indígena tenha para ela contribuído, ao nosso ver sua ação é quase imperceptível."

Em Música popular brasileira (1950), Oneyda Alvarenga relata um fato interessante sobre a fácil adaptação do indígena: "Até a segunda metade do século XVIII, os índios do Estado de Pernambuco ainda se encarregavam da música de igreja de suas aldeias, tocando órgão, cantando missas, ladainhas, ofícios da Senhora e jaculatórias, com bem concertadas vozes". (Música Popular Brasileira, 1950, 21) Para Oneyda Alvarenga, o índio não reagiu à dominação da cultura européia. Os elementos de sua própria cultura foram substituídos por costumes europeus e assimilados tão fortemente pela nova sociedade que estava a se formar, que não deixaram indícios, não sendo possível historiar e analisar o processo de incorporação sofrido.

Mário de Andrade, em Música doce música (ed. 1976, 18), chama a atenção para o reconhecimento da proveniência indígena em certos processos de cantar que são comuns a todo o país; especialmente o timbre nasal, muito usado pelas diversas raças indígenas aqui existentes, que permaneceu na voz brasileira, ainda que considere bem mais importante a contribuição africana e européia.

Pe. José Geraldo de Souza, em Contribuição rítmico-modal do Canto Gregoriano para a música popular brasileira (1959,12), diz ser o anasalado do canto - perceptível em todo o país, porém mais acentuado na entoação nordestina - uma constância nossa e que nos veio do elemento indígena e do africano.

Voltando a Baptista Siqueira, encontramos em seu trabalho Os Cariris do Nordeste (1978) importantes abordagens sobre a cultura e os processos de aculturação sofridos pelo índio, numa extensa e bem cuidada pesquisa, comportando ainda 39 exemplos musicais de rara beleza e que refletem claramente a influência do elemento ameríndio na cultura popular da região.

 

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