Timbre Correspondencia Euro-Brasileira

Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica
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N° 11 (1991: 3)


 

Personalidades

Antonio Alexandre Bispo

(Excertos)

 

Felix Lima JrFÉLIX LIMA Jr.

Nascido na capital de Alagoas, em 1901, Félix Lima Júnior é considerado o "historiador de Maceió". Sem ter realizado cursos superiores, adquiriu auto-didaticamente conhecimento humanístico e dedicou-se desde cedo à formação de um acervo de documentos históricos. Membro dos mais destacados de instituições culturais de Alagoas, publicou um trabalho de pesquisa de particular interesse musicológico local. No seu livro Dois maestros alagoanos, estuda a vida e obra dos mestres Misael Domingues, de Marechal Deodoro, e Manoel Lima (Nezinho Cego), de Pão de Açúcar. Este livro foi o segundo da Série "Pesquisa -Área Música" da Fundação Teatro Deodoro. O primeiro número dessa série foi dedicado à monografia sobre o Maestro Benedito Silva de Paulo de Castro Silveira (cf. trabalho de divulgação do Museu da Imagem e do Som - FUNTED, Boletim Alagoano de Folclore XXX-XXXIII/ N° 11, 1987, 21-24). Um necrológio foi publicado no Boletim Alagoano de Folclore XXX-XXXIII/11 (1987).

 


 

ERNANI OCTACÍLIO MÉRO

Ernani Octacílio Méro, o principal representante da reflexão histórico-musical de Penedo, distingue-se tanto pela sua dedicação a assuntos históricos em geral como pela sua atuação prático-musical. Licenciado em Estudos Sociais, E. Méro colocou a sua formação humanística principalmente a serviço do magistério e da imprensa. Foi professor de Geografia em escolas de Penedo e de Maceió, monitor da cátedra de História da Idade Média da Faculdade de Professores de Penedo e docente de História da Arte no Brasil no Centro de Estudos Superiores de Maceió, além de ter ministrado cursos específicos, com temas como "História de Penedo" (sob o patrocínio da Universidade Federal de Alagoas) e "Estilo Barroco em Alagoas" (sob o patrocínio do SENAC). A serviço da imprensa, E. Méro salientou-se com artigos a respeito de nomes da história penedense no jornal local "O Apóstolo" e pela sua colaboração a vários outros órgãos, tais como o "Jornal de Alagoas" e o "Correio do São Francisco".

No campo prático-musical, cumpre citar a sua atuação como regente frente a coros das sés de Penedo e Maceió e como membro da Comissão de Música Sacra da Arquidiocese de Maceió. É também compositor, sobretudo de música sacra e de hinos para entidades de Penedo ("Hino do Colégio Diocesano de Penedo"; "Hino da Imperial Filarmônica Sete de Setembro"; "Hino da Padroeira da Igreja Nova"; "Hino das Bodas de Ouro das Filhas de Maria").

Sócio fundador da Academia Penedense de Letras e da União Teatral de Amadores de Penedo, ingressou no Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas em 1977 (cf. José Franklin Casado de Lima, "Um Penedense no Instituto", Revista do IHGA XXXV, 1979, 105-108). No discurso de saudação proferido na ocasião, salientou a principal característica de seus esforços, ou seja, a valorização e a preservação do patrimônio histórico de Penedo. Relembrando as entidades e tradições locais (procissão do Bom Jesus dos Navegantes, Natal, Reisados, Pastorís, Maracatús, Cheganças), E. Méro lamenta sobretudo a decadência cultural local pelas transformações ocorridas na prática da música sacra: "Agora tudo é silêncio, (...) Nem luz a tremular, muito menos vozes/ De frade a cantar/ Tudo é o mesmo silêncio!/ Calaram-se as orquestras, /As arcadas dos violinos/ As flautas desapareceram!"

Empenhou-se sobretudo pela conservação do Teatro 7 de Setembro de sua cidade. Considerando-se "não como cientista, nem pesquisador, mas como um modesto curioso provinciano que sempre teve pela música um encanto, de modo especial, pela música religiosa brasileira", publicou ele um singular artigo de título "O Panorama da música religiosa brasileira", onde observações pertinentes se mesclam com singulares considerações (Boletim Alagoano de Folclore, XXX-XXXIII/11, 1987, 91-108).

 


 

VENUZIA DE BARROS MÉLO

Tendo iniciado seu aprendizado de música em 1933/34, teve, entre os seus professores, os alagoanos Aristóbulo Cardoso, Carmelita Taveiros, João Ulisses Botelho e Aída Wucherer, também estudando com Maria Yedda Cadah, Nanccy Namur, Vitório Stzefanini, Vieira Brandão e Elzira Amabile. Mantém um Conservatório de Música, considerado como Departamento de Alagoas do Conservatório Brasileiro de Música, fundado com a colaboração de Aida Wucherer Braga. Em 1961, foi nomeada Vice-Presidente da Ordem dos Músicos, Conselho de Alagoas, assumindo posteriormente a Presidência da entidade. É diretora do Coral Villa-Lobos. A 2 de dezembro de 1971, foi-lhe concedido o título de Sócia Benemérita do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas e a medalha relativa ao primeiro centenário da instituição. O discurso de saudação foi proferido por Abelardo Duarte (Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas XXX, 1973, 179-187). A. Duarte salientou a participação de V. de Barros Mélo nas audições do instituto e situou o trabalho da homenageada dentro da tradição alagoana:

"...bem apreciados os fatos, temos uma tradição, que vem de longe, de cultivo da música. Boas orquestras aqui já tivemos e que se reuniam às trazidas por companhias líricas e de operetas, nacionais ou estrangeiras, quando não elas mesmas as substituiam, sob a regência de maestros como João Ulisses Moreira, de saudosa memória."

Venuzia de Barros Melo O PianoA. Duarte entrou também em considerações a respeito da musicologia no Brasil, citando Batista Siqueira e Renato Almeida, para finalmente considerar o trabalho de cunho musicológico da homenageada:

"Sois também musicóloga, autora das obras 'Aspectos Educacionais do Canto Orfeônico na Escola', 'O piano sob o aspecto cultural e psicológico' e de uma síntese histórica - 'Fundação da minha Academia', (...) o que revela e comprova a vossa natureza artística. É esta, a de musicóloga, outra faceta que se deve proclamar desta verdadeira artista que estamos a homenagear. Artista de cuja assombrosa atividade dizem suficientemente bem as 648 apresentações em público sob a vossa direção." (pág. 185)

No seu divulgado livro O Piano sob o aspecto cultural e psicológico (Maceió, 1968), aberto com prefácio de Théo Brandão, V. de Barros Mélo expõe alguns pontos básicos de seu pensamento:

"Diante das inovações revolucionárias psicopedagógicas da atualidade, perguntam-nos, e nós já tivemos época na qual perguntávamos a nós mesma: tudo o que foi en sinado até há bem poucos anos estava errado? Como é que apesar dos erros, houve tanta gente bem preparada em todos os sentidos e tantos deixaram heranças riquíssimas de saber e de exemplos de bom emprêgo deste saber? (...) Procurando observar, cheguei à conclusão de que os pontos principais e fundamentais para formarmos professores da categoria adequada são os seguintes: - Procurar conhecer em cada aluno a estrutura física-morfológica (constituição), a estrutura fisiológica-humoral (temperamento), a estrutura psicológica (caráter) e a estrutura espiritual (eu)."

 


 

GUIOMAR ALCIDES DE CASTRO

Na sua obra Dois Músicos de outrora (para a história da música em Maceió), publicado pelo Arquivo Público de Alagoas, em separata do número da Revista do Arquivo que deveria ter sido lançada dentro do programa das comemorações do Sesquicentenário do Município de Maceió (1965), em 1966, a escritora Guiomar Alcides de Castro faz anteceder o objeto de seu estudo por longa "Nota introdutória" na qual trata de questões histórico-estéticas para a conceituação da cultura musical brasileira. Cita vários estudiosos, entre outros Renato Almeida e José Geraldo de Souza. Trata da música folclórica como "ecos percutidos da legítima origem, esquecidos ou abandonados no tempo, que devem ser redescobertos e reabilitados como identidade inalienável da lídima grei". Para ela, o elemento português foi o primordial na formação histórico-musical do Brasil (pág. 10):

"Muitos países, em verdade, conservam indelével na sua cultura a marca de outras civilizações, no entanto, nunca tão forte como essa ascendência que predomina no Brasil quanto à estruturação musical. (...) É o que se verifica em Alagoas, máxime com os seus gênios artísticos constituídos de homens pobres, que enterraram o talento em campo sáfaro, semente que à falta de condição climatérica não germinou. Estiolou-se no desestímulo." (pág. 11)

Defendendo também a mesma opinião de L. Lavenère quanto ao conceito de música alagoana, embora não explicitamente citado, diz que "(...) nunca a nossa música poderia cristalizar sua alagoanidade, uma vez que não alcançamos possibilidades capazes de descobrí-la e vivê-la." A autora quer não a procura de traços originais, genuínos, mas o cultivo das tradições realmente existentes na prática musical: "Contentemo-nos, todavia, em aceitá-la e divulgá-la como é, límpida na originalidade, quaisquer lhe sejam as antigas vertentes. (pág. 13) (...) Realizemo-la, por conseguinte, provinda seja de onde for a hegemonia, mas com os caraacteres emotivos que são nossos (...)" (pág. 14). Segundo ela, "História e folclore se entrelaçam na mesma analogia e na mesma finalidade para conhecimento e propagação dos fatos, usos e memórias reveladores de nossa civilização." (pág. 16)

Como exemplo de procedimento de alagoano que deu a contribuição de sua cultura particular à do Brasil cita Hekel Tavares (1896-1969). (pág. 17)

A partir da exposição de seus conceitos, a autora passa a ressaltar o perigo representado pela difusão da música popular: "Em pleno século da bossa-nova, onde o furor infernal do iê-iê-iê, importação clandestina dos Beatles, domina a atordoada juventude com sêde de abismos na roleta paulista, façamos com que se não releguem o ideal e o esfôrço dos nossos compositores." (pág. 17) E faz o apêlo: "Que se não destrua, na fugacidade do tempo, esmagada por utilitarismo vão e por anseios imediatistas, a obra que se enceta de definir e individuar a música nossa, implicando preocupação de quem se interessa pela arte no Brasil. (...) Ninguém pode desligar-se da origem, nem perder a inferência do berço porque marcado por traços profundos, que insistem em revelar e trair a identificação." (pág. 17)

Carlos de Gusmao Boca da GrotaA esse apêlo de Guiomar Alcides de Castro procurou dar resposta Carlos de Gusmão, no seu livro Bôca da Grota: Reminiscências (Maceió: Gazeta de Alagoas, 1970, págs. 459-464):

"Não. Esse ideal e esse esfôrço não serão relegados. Eles se vêm concretizando, e continuarão a vir, em criações com raízes etológicas, criações eternas. (...) Nada haverá que destrua isso. (...) Contra ela é inofensiva a influência desses modismos musicais que a tanta gente impressionam e divertem. Arrastam na onde a mocidade e até mesmo, vamos confessar, a madureza. (...) É o revolucionarismo. E eu não precisaria mesmo dizer como, a ele assim me referindo, não o faço pela razão de excluir da música brasileira o espírito renovador, evolucionário e até revolucionário a que ela não deve fugir, e nunca fugiu (...) (pág. 462). Mêdo não devemos ter do iê-iê-iê (...). Tenho a propósito dele impressões que já fixei em caricaturas. (...) A primeira em 1967. Nela risquei figuras partidas, fragmentárias, omissivas, desfeitas em pedaços de gente, e agitadas numa verdadeira ânsia ou desespêro explosivo e sincopado duma bateria de jazz. (....) Depois, em 1968, me deu na telha outra concepção. Vi como o iê-iê-iê é em verdade uma expressão menos mental do que material: é realista. (...) Diferente da valsa, do bolero, do tango argentino, do foxtrote, da marcha, do samba e de outras formas de bailar obedientes a regras em que à coreografia acompanham pensamentos individualistas, enlevos e palavras (...). E então risquei-o em figuras concretas, completas, reais, sem fragmentações, mas que na sua ânsia (não sei de que) quase incompreensível, nem somente se misturam: fundem-se, interpenetram-se, cruzam-se, entram umas pelas outras, formando um todo de muitos (...). (pág. 463). Sinto no iê-iê-iê um misto de seres ingênuos e maliciosos, frios e ardentes, alegres e quase alucinados, agressivos e meigos, estuantes de desejos irrealizados e irrealizáveis de um mundo que não é o nosso, mas que também não é outro. (...) O iê-iê-iê é um modernismo: passa. Tranquilize-se, pois, Guiomar Alcides, que a música brasileira, a nossa música, do ideal e do esfôrço dos nossos compositores, antigos e modernos nada sofrerá." (pág. 464)

Guiomar Alcides de Castro, no seu livro Professor João Ulysses Moreira (vide N° 9 desta publicação), aproveita a oportunidade para fazer o reconhecimento em público do trabalho de Bráulio Leite Júnior para o fomento da vida musical alagoana da atualidade. Segundo ela, membro do Conselho de Cultura de Alagoas, o Diretor-Presidente da Fundação Teatro Deodoro teria levado esse teatro à fase mais dinâmica dos seus setenta anos de existência. Com o teatro transformado em fundação foi possível ter-se autonomia e disponibilidade financeira para inúmeras realizações. Lembra a Orquestra Filarmônica de Alagoas, a Orquestra de Câmara com os seus concertos públicos e internos, os concertos nas igrejas da capital e do interior, as apresentações em praças públicas, o Sexteto de Flautas Medievais e os Quintetos de Metais, além de cursos livres de Harmonia, Canto e Prática Instrumental. Ressalta o fornecimento de instrumental e bandas de música, e, entre as instituições, cita a sua atuação no Museu de Imagem e do Som e no Centro de Belas Artes. O folclore estaria representado com festejos juninos e natalinos, encontros de violeiros e repentistas, além de bandas de pífanos.

 

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